domingo, 27 de outubro de 2024

DOAÇÕES PATRIMONIAIS PARA A FORMAÇÃO DE SANTA CRUZ

1. Patrimônio da Santa Cruz
O fazendeiro Manoel Francisco Soares, entre os anos de 1861/1862, doou ao Patrimônio da Santa Cruz, cem alqueires de terras para oficialização do povoado, a partir da barra do Ribeirão [do] São Domingos e, por ele acima, até o valo feito rumo ao Rio Pardo, pelo qual abaixo ao início da demarcação (ACMSP, Relatório dos Bens Imóveis da Diocese de São Paulo de 1904: 55-56).
Antigo mapa mostra referência ao valo, como ordenamento do território urbano (Plano de Pormenor – PP), a partir do Ribeirão de São Domingos num ponto imaginário, grosso modo, entre as atuais Rua Francisco M Oliveira e Travessa Carmelo Comegno, em direção ao término da Rua Carlos Gomes, obliquando e de passagem pelas vias públicas General Carneiro, Marechal Floriano Peixoto e Antonio Mardegan em rumo à Travessa Marechal Deodoro para, em suave desvio à direita chegar à margem do Rio Pardo, entremeio as ruas Padre Pio Giocondo de Lorgna e Pedro Manoel de Andrade (Arquivo Público do Estado de São Paulo – APESP, IGC_IGG_CAR_I_S_0033_001_001).
Para melhor compreensão por onde passava tal valo, o Decreto-Lei [Municipal] nº 1-A, no início dos anos 1940, informava conforme cópia transcrita:  
Art. 1º – A zona urbana da sede do municipio de Santa Cruz do Rio pardo fica assim delimitada: – começa na rua Joaquim Manoel de Andrade a 40 metros alem da rua Conselheiro Saraiva, nas proximidades de um valo, (...)." , dai o prosseguimento das demais demarcações da zona urbana santa-cruzense da época.
Os quarenta metros de fundo entre a rua Conselheiro Saraiva e o valo divisor, de 1861/1862, seriam indevidamente apropriados, com igualmente quarenta metros de largura, fazendo frente para a citada via pública.
Outros documentos resgatados junto a Cúria Diocesana de Ourinhos testificam a posse e administração da Igreja, desde 1861/1862, sobre as terras doadas por Soares ao Patrimônio da Santa Cruz (Juízo Municipal, SCR.Pardo, Processo de 28/07/1890). 
José dos Santos Coutinho, aos 12 de dezembro de 1891, idade de 75 anos, no referido processo reconheceu a doação dos terrenos por seu sogro, Manoel Francisco Soares "para que a Igreja tivesse seu patrimonio e amparo de Nossa Senhora protegesse a elle doador e sua familia contra o asalto dos indios que infestavam nessa época este sertão". 
O pioneiro Joaquim Pereira da Silva, idade 62 anos, ao testemunhar no mesmo expediente, aos 12 de dezembro de 1891, declarou: "Que essa doação foi uma promessa para livral-os dos selvagens habitantes destas mattas e elle testemunha, conjuntamente com outras pessoas, foi quem erigio o Cruzeiro no largo atualmente da matriz".
O reverendo padre João Domingos Figueira, comprovado morador do lugar entre os anos 1861 a 1878, assegurou em carta ao Bispado de São Paulo, em 1862, a doação dos cem alqueires de terras para o Patrimônio da Santa Cruz (ACMSP, Documentos Diversos para SCR. Pardo), mas não especificou quem foi o doador.

2. Patrimônio do Santo Antonio 
O casal José dos Santos Coutinho e Rita de Sene, genro e filha de Manoel Francisco Soares, aos 09 de março de 1868 doaram vinte alqueires de terras ao Patrimônio do Santo Antonio, parte onde o atual Bairro São José, conforme escritura lavrada em São Domingos (Livro de Notas, nº 3, fls. 59-v a 60-v, 1º traslado pelo Tabelião de Santa Bárbara do Rio Pardo, aos 04 de dezembro de 1891).
O terreno pertencera antes a João Paulo Garcia, extraído da primitiva posse de Faustino Machado de Oliveira. Mapa referente ao patrimônio, datado de 14/04/1900, assinado pelo engenheiro Lars Swenson, revela dimensão do terreno em 24,2 alqueires (Prefeitura SCR. Pardo, Cadastro).
Documentos de 1893 revelam posse imediata da Igreja sobre os bens, já em 1868, formando povoado (Cúria Diocesana de Ourinhos, Documentos para SCR. Pardo), anexado ao da Santa Cruz, para um só núcleo residencial. 

3. Formação da 'Capela Santa Cruz do Rio Pardo' 
Citada crônica de 1887 informa que o pioneiro Manoel Francisco Soares residia na sede da sua fazenda, onde "uma cruz de madeira, que orgulhosamente se ostentava na beira do terreiro de sua habitação" (Almanach da Provincia de São Paulo, 1887: 541), e outras moradias havia, daí o nome 'Bairro Santa Cruz', posteriormente elevado a Capela, com o designativo Santa Cruz acrescido do Rio Pardo. Desde 1855 a sede da Fazenda Santa Cruz servia como 'Bairro Rural' aos primeiros desbravadores da região.
Soares mandara, ainda, construir pequeno espaço religioso, coberto "(...) com taquáras rachadas e sobre-postas umas ás outras (...). E desde então ficou a Santa Cruz como sendo a padroeira da povoação." (Almanach da Provincia de São Paulo, 1887: 542). 
Diferentemente da publicação, padre Figueira, numa carta de 1862 ao Bispado de São Paulo informava: "(...). Dois anos habitei entre elles, neste tempo erigio-se huma capella mór com presbiteryo, altar sacraico, throno retabulo, forrada, assoalhada, com corredores dos lados o mesmo e sachristia. (...)". Com Igreja [templo] decente, o bairro apresentava condições de ser elevado à condição de Capela, cumprindo exigência eclesiástica (...)." (ACMSP, Documentos Diversos para Santa Cruz do Rio Pardo).
A mesma crônica apontava a presença do padre João Domingos Figueira, fazendeiro residente no Bairro Santa Cruz, vizinho de Manoel Francisco Soares (Almanach para Provincia de S. Paulo, 1887: 542), o doador das terras para o Patrimônio da Santa Cruz, entre 1861/1862, nas quais o padre pôs-se a trabalhar para a formação urbana, com o rossio, a fixação do cruzeiro e a ereção de templo religioso, permitindo a elevação do bairro à condição de Capela, denominada Santa Cruz do Rio Pardo, jurisdicionada à Freguesia de São Domingos, no município de Botucatu.
O ativismo de Figueira atraiu rivalidade do Padre Andrea Barra, Vigário em São João de São Domingos e capelão no Sertão. Desentenderam-se.
Ausente qualquer expediente anterior de oficialização, aos 23 de novembro de 1862 o povoado teve sua primeira identificação civil conhecida, como Santa Cruz do Rio Pardo, num ofício expedido pela Câmara Municipal de Botucatu à Presidência da Província de São Paulo:
"Ha neste Municipio sette Igreijas, a Matriz desta Villa, a de Lençois, a de São Domingos, da Piedade do Rio do Peixe, a de Santa Crus do Rio Pardo, da Santa dos Remedios no Tiete, e a do Rio Novo, as treis primeiras pouco tem sido auxiliada pelo Governo, e as ultimas mais pequenas porem decentes e feitas a custa dos fieis, pelo que V.Exa. colligera que neste Município o povo he religiozo o que sertamente satisfara ao Governo de V.Exa. para assim ajudal-los." (AESP/BTCT, Documentos: Ofícios Diversos).
Aos 25 de novembro de 1862, também a Igreja reconheceria o lugar como Capela Santa Cruz, no registro de batismo de Maria, filha de Miguel ou Miziel com a liberta Rozalia:
"(...). Na Capela filial de Santa Crus Baptizei pus santos oleo na inosente Maria de idade de tres mes filga legitima de Mizial [e] Rozalia, Escravo do Padre João Domingos Figueira, forão padrinhos Jose Peres das Chagas e Maria Inosencia da Conceição (...) – Padre Andrea Barra." (Eclesial, 1859/1879).
O padre Figueira, referiu-se à Santa Cruz do Rio Pardo de 1862:
"(...) nova povoação cujo povo bem dedicado ao servisso de Deos e da Igreja com minha estada de dois annos fes se uma Capella môr, forrada, assoalhada, com Prezbiterio, altar, trono, sacrário, e retabulo. O patrimonio doado é de 100 alqueires já conta com 18 a 20 fogões no arraial. A afluencia do povo é imensa. (...)." (ACMSP, Documentos Diversos para Santa Cruz do Rio Pardo).
O edifício sacro construído pelo padre Figueira, ou às suas ordens, situou-se onde parte dos fundos da atual matriz de São Sebastião - pequena Praça denominada Anchieta, e o templo era visto como significativa construção para o ano de 1862, com as medidas de 40 por 60 palmos, equivalendo a 8,80 metros de frente por 13,20 de fundos, com reparos e adaptações dez anos depois para servir de Matriz, a partir de 1873 (Cúria Diocesana de Ourinhos, Documentos para SCRPardo, Processo de elevação para Freguesia, 28/12/1872). 
-o-
Contato: pradocel@gmail.com